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Jusant e o poder dos jogos como escape

Por vezes, distrair a cabeça é o suficiente.

Image credit: DontNod

Muito do poder dos videojogos está no seu papel como escape ao drama do mundo real. Isso é algo muito pessoal e por mais comuns que sejam os elementos que nos unem enquanto gamers, existem sempre especificidades que vão diferenciar a nossa história pessoal. No meio das similaridades, a pandemia COVID-19 e o isolamento social reforçaram o quão importante pode ser o entretenimento interativo para lidar melhor com questões que ameaçam derrubar as nossas defesas.

Na semana passada perdi o meu avô e fiquei sem vontade de jogar, até mesmo pelo entretenimento não interativo. Não foi uma figura presente nestes últimos anos, mas trata-se da pessoa que me criou em criança e que incentivou o meu gosto pelas diversas artes, a curiosidade e até formas de abordar a vida. Isto fez-me pensar noutros tempos e tirou-me a vontade de me entreter a jogar. Anteriormente, estava a adorar jogar Cyberpunk 2077 e conhecer Night City, mas não me conseguia mais concentrar no jogo e tive de parar.

No passado, os videojogos sempre ajudaram em momentos menos felizes, mas desta vez não. No entanto, após dois dias sem jogar nada, senti que devia mais uma vez recorrer à preciosa ajuda que tão bem me fez em momentos de aperto e que devia procurar algo para me ajudar a escapar à realidade, para me perder numa aventura. Lembrei-me que deixei escapar Jusant, lançado no final de outubro, e decidi apostar nesta experiência indie. Não me apetecia jogar algo muito longo, que exige imensa concentração. Preferia jogar algo curto, menos exigente em busca de uma sensação de maravilhamento.

Os jogos Life is Strange da Don't Nod já foram um precioso alimento para o intelecto e alma quando os joguei e como não queria passar ao lado de Jusant, foi a minha aposta para procurar desanuviar a cabeça. Talvez por ser novidade, um jogo que não joguei antes, por ser da Don't Nod ou pelos comentários que li a descrevê-lo como um jogo relaxante, meditativo, curto e com um lado artístico que captura.

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O que posso dizer é que a aposta nesta experiência da produtora francesa resultou, ajudou-me imenso a escapar para aquele local absolutamente hipnotizante. Jusant durou-me perto de 5 horas e foi tudo o que procurava, o que precisava, como um bálsamo para a alma que me ajudou a sossegar a mente. Acabei-o numa tarde e recomendo vivamente a qualquer pessoa que deseje ir além do mainstream AAA nesta indústria. É o tipo de jogo apaixonante que me faz adorar a diversidade nos videojogos.

Jusant é um daqueles jogos sobre viajar para um local imponente, desolado e no qual estarás a encontrar constantemente ecos do passado. Aquele ambiente de vidas largadas a meio porque algo misterioso assim forçou. A enorme torre que o protagonista escala reserva diversos segredos e mistérios, descobertos com a ajuda da pequena criatura que o acompanha. Existem diversas mecânicas familiares, no geral é um jogo que te deixa a pensar em diversas outras experiências independentes, mas tem imenso carisma e a sua própria identidade.

A aposta numa experiência de escalada já o torna diferente de praticamente tudo o que jogaste, mas a abordagem artística contribuiu imenso para criar algo quase hipnotizante, mais importante do que qualquer mecânica de jogo. Sim, escalar e procurar o caminho a seguir é simples, mas muito eficaz, com a barra de vitalidade a servir para causar uma ligeiríssima pressão nos teus movimentos e agilidade, mas é a experiência no geral que realmente se mostra eficaz para estimular o teu imaginário.

A experiência é curta, mas vale todos os segundos e foram vários os momentos que dei por mim a explorar mais os locais, sempre à procura de segredos, para prolongar Jusant, à espreita em todos os cantos por mais um momento de descoberta que iria trazer mais segundos de poesia visual. Os textos que contam histórias de habitantes daquela montanha enorme também reforçam bem a sensação de abandono que tanto mistério confere ao local.

É fascinante o imaginário apresentado pela produtora francesa neste ambiente. Quanto mais sobes, mais comuns se tornam os elementos que mostram como caminhas por locais onde a água, talvez um oceano, já tocou. Isto acaba por conferir um fascínio muito próprio a Jusant e talvez seja algo inspirado em experiências como Journey, onde o tom misterioso e a sede por descobrimento tornam-se em alicerces importantes da experiência.

Jusant não se importa sequer em ser difícil ou te desafiar de forma intensa. O capítulo 5, com o vento, exige mais de ti, mas ainda assim é uma experiência para jogar e sentir, muito mais do que desafiar. Escalar e identificar os locais para escalar foi muito divertido, mas procurar informações da civilização que ali já viveu e o que lhes aconteceu também foi enriquecedor.

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No meu caso, Jusant foi o jogo que se enquadrou com as minhas necessidades para usar os videojogos como escape, de uma forma muito mais pessoal. Poderá ser qualquer jogo, muitas vezes de forma inesperada, a cumprir esse papel no caso de outra pessoa, mas é inegável que o elemento interativo nestas experiências que tanto adoramos podem fazer uma enorme diferença para nos ajudar a escapar do drama da realidade, que muitas vezes ameaça esmagar-nos.

Nos tempos da pandemia, chegou a tornar-se confuso passar tempo a jogar videojogos quando o mundo estava numa situação tão bizarra, mas a verdade é que ajudaram imenso. Lembro-me que fiquei viciado em speedruns do remake de Resident Evil 3 e o remake de Final Fantasy 7 ajudou a minha mente a desligar da realidade e a viajar para outro mundo. Existem outros exemplos, mas estes foram os primeiros grandes exemplos perto do início da pandemia e que marcaram com especial ênfase. Mais uma vez, isto é algo muito pessoal e no teu caso certamente terás nomes diferentes para um sentimento similar.

Jusant serviu como bálsamo para um momento mais pessoal, igualmente confuso e que ameaçou tirar-me a vontade de jogar durante muito mais tempo. A abordagem da Don't Nod Entertainment numa vertente artística, relaxante e num gameplay raro de ver, a escalada, num local remoto e desprovido de vida, com aquela hipnotizante sensação de um quotidiano abandonado de forma misteriosa, sobrando apenas os seus ecos, fizeram-me escapar do mundo real e é por isto que sigo extremamente agradecido aos videojogos.

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