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Shantae and the Pirate's Curse - Análise

Poderosos cabelos.

Eurogamer.pt - Recomendado crachá
Um tributo aos grandes jogos de acção e plataformas a 2D. Conquista pelas mecânicas progressivas, não linearidade e belos sprites.

A devoção da impressionante californiana WayForward pela era perdida dos jogos a 2D e por Shantae, uma personagem feminina melhor conhecida por quem jogou o primeiro jogo do estúdio para a Game Boy Color, corria 2002, dá mais uma vez os seus frutos com o lançamento de uma nova empreitada: Shantae and the Pirate's Curse, para as consolas da Nintendo Wii U e 3DS, e que agora analisamos. De certo modo o jogo assinala um regresso a casa, a um ambiente e personagens que a produtora tão bem conhece mas também a um desafio e produção 2D, com todos os sprites e efeitos, no fundo boas memórias e recordações por quem passou por essa magnífica era.

Na viragem do milénio, os jogos criados exclusivamente em 2D contavam-se quase pelas mãos dos dedos. A abertura aos gráficos tridimensionais tornou-se caminho central e a via para o sucesso, afinal as plataformas mais potentes eram lançadas com processadores inovadores e adequados a promover novas experiências tridimensionais. Como resultado os jogos em 2D foram sendo cada vez mais escassos, pelas fracas vendas, e só os relançamentos em alta definição assim como os trabalhos de autor, de então para cá constituíram a excepção. Um dos melhores exemplos da recuperação desta era perdida é precisamente Shovel Knight, da Yacht Club Games, estúdio no qual militam inclusive alguns ex-membros da WayForward.

O ecrã táctil providencia uma série de opções: mapa, items, entre outros.

Eu adoro jogos em 2D, sobretudo os de plataformas e acção, com uma apreciável oferta de puzzles pelo meio. Nem vale a pena discutir os méritos de um Metroid, Mega Man, Sparkster, Super Mario World, Ghouls'n Ghosts, Castlevania Symphony of the Night e por aí adiante. O que aliás me faz estar tremendamente expectante sobre o Mighty Nr. 9. Mas também é certo que as exigências de uma produção 2D em 2015, não são as mesmas de um jogo produzido em 1989 ou 1991. As ferramentas são melhores e mais amigáveis, há um mar de influências muito grande, quando há trinta anos os produtores estavam a fabricar as bases de muitos géneros, com rudimentares jogos 8-bit a servir de inspiração, pelo que é sempre com uma atenção redobrada sobre as mecânicas de jogo que olhamos para estes exemplos que no fundo pretendem oferecer mais do que um mero revivalismo.

Shantae and The Pirate's Curse, à primeira vista, parece ser apenas mais um jogo 2D de scroll horizontal e vertical. A estética, ainda que trabalhada, limpa e colorida, capaz de sobressair com elegância no design e particular brilho, vai buscar muita da arte do original para a Game Boy Color, mas também alguns elementos de Shantae Risky's Revenge (DSiWare 2010). Mas também é mais do que um somatório de influências da própria série. Sem perder a personalidade que caracteriza esta particular personagem, Shantae and The Pirate's Curse vai ganhando cada vez mais substância e novos elementos à medida que nos aventuramos pelas ilhas e territórios que compõem Sequin Land, com marcas sonoras e um ambiente típico das mil e uma noites.

Com alguns conceitos de The Legend of Zelda (como a utilização de itens específicos para certos territórios) e algum "backtracking" típico de Metroid ou Castlevania, o ritmo fluido dos combates e os puzzles intricados, assim como a arte, são autoria clara do próprio estúdio. Este jogo não abdica por isso de algumas tentações, em assumir as influências de alguns padrões e conceitos consagrados, o que de certa maneira impede voos maiores. Mas parece-me, ainda assim, um dos melhores senão o melhor trabalho do estúdio ao longo dos últimos anos e sobretudo é o melhor Shantae, com um preço aliás bem convidativo (17.99 euros) na eShop, sendo que se trata de uma distribuição exclusivamente digital.

Boa banda sonora de Jake Kaufman, sempre em destaque nos momentos cruciais.

Outrora rival do malévolo pirata Risky Boots, desta vez o jogo apresenta-nos um argumento diferente, pondo os rivais em parceria, numa coligação de forças a fim de salvar Sequin de uma entidade malévola. Até porque como génio da lâmpada que é esta bailarina capa do jogo, procura recuperar, nessa aventura, a magia perdida. A aventura está cheia de peripécias e viagens até quase uma dezena de diferentes territórios, cada um com a sua temática, uma zona intermédia e a masmorra, com os seus múltiplos percursos, desvios secretos, puzzles e câmaras onde se escondem poderosos "bosses".

A nossa protagonista arreda pé desprovida de equipamento e com poucas habilidades à sua disposição. De início pouco mais há que alguns objectos que lhe conferem poderes limitados (obtidos à custa dos inimigos derrotados) e movimentos como o golpe executado com o movimento de cabeça projectando os seus cabelos na direcção do inimigo como se fosse um chicote. A técnica não é nova e o salto de Shantae está muito bem trabalhado, com regulação da intensidade da pressão, ideal para manobrar em espaços apertados. Mas assim que avançamos entre territórios ganhamos mais poderes como uma pistola, o larguíssimo chapéu de Risky Boots, com o qual podemos sobrevoar certos pontos e subir por colunas de ar quente, bem as temíveis botas e ainda um canhão.

A somar à quantidade de objectos que podemos comprar nas imediações do palácio, onde abundam lojas que vendem diferentes produtos, assim como tanques cobertos de água que permitem uma recuperação imediata de saúde, muitas missões secundárias podem ser completadas de modo a melhorar a condição da personagem. Não é como um role play de acção, mas podemos fazer subir o indicador de saúde (como acontece em Zelda), encontrando as "heart squids".

Convém ter bons items regeneradores de saúde sempre à mão nestas batalhas.

Mas ao invés de tornar tudo linear e previsível, viajamos pelos diferentes territórios como se estivéssemos num mundo aberto. Quase sempre somos levados a regressar a uma área já percorrida porque já dispomos do item que nos faltava para atravessar aquela secção e arrecadar o tesouro ou a poção ou o objecto que necessitamos. Por vezes o "backtracking" pode tornar-se uma tarefa árdua e algo extenuante por nos forçar a defrontar os mesmos inimigos e pela interrupção que causa no progresso, mas obriga-nos a explorar melhor os territórios, a ganhar mapas (que nos lembram os mapas das masmorras de um Zelda) e a dominar melhor os movimentos. Os atalhos dão uma ajuda e já sabemos como superar certos inimigos.

A variedade de inimigos e design das masmorras está muito bem conseguida. Quase sempre somos surpreendidos com uma nova temática e desenho. Há muita tentativa e erro pelo meio, perdemos até um bom par de vidas à custa da tenacidade dos adversários, mas os "bosses" finais contribuem com sólidos desafios, requerendo alguma paciência e a melhor utilização dos movimentos e poderes. Como não é mostrada a barra de saúde deles ficamos sempre na dúvida sobre o número de golpes que ainda nos falta aplicar até ficarem sem vida.

Em termos de arte e tratamento visual a WayForward recuperou a arte dos sprites clássicos, com uma fluidez impressionante. O jogo é bonito e mesmo que a personagem seja pequena devido ao zoom out imposto pela perspectiva de jogo, há toda uma zona envolvente que é destacada, com uma grande atenção ao detalhe, cenários pré-renderizados e gloriosos efeitos, como chuva e tempestades, com efeitos de iluminação causados pelos raios em contraste com o escuro da floresta. Gráficos muito limpos e visualmente cuidados, num trabalho do estúdio claramente acima da média.

Shantae and the Pirate's Curse não é tão apurado e mais afastado das influências como por exemplo Shovel Knight, um jogo que materializa melhor a intenção dos produtores, a nostalgia pelos jogos 8 bit mas com peso na originalidade. Já o jogo da WayForward, parecendo, não é apenas só mais um e consegue proporcionar um desafio muito sólido enquanto revela uma produção cuidada, com a complexidade que um jogador veterano e amante dos jogos 2D espera encontrar.

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