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Manuais de instruções

De um ritual a cumprir com um novo jogo até perder o significado.

Quando foi a última vez que leu um manual antes de introduzir o disco no seu aparelho reprodutor de videojogos? Se só há pouco tempo passou a lidar com este passatempo é bem provável que tenha ignorado o pequeno manual de instruções e, sem relutância, tenha avançado compulsivamente para o jogo em causa, aprendendo os movimentos da personagem e regras fundamentais à custa dos níveis de aprendizagem e demonstração, especificamente elaborados para permitirem um maior acesso e imediata aclimatação. Não será suficiente para se chegar ao ponto de afirmar que dois dedos de níveis substituíram definitivamente um belo, repleto e ilustrado manual – muitas vezes pejado de arte que serviu de fundações para a obra. Vários factores conjugam o desvalor que hoje passa pelos pequenos livros, verdadeiras edições de bolso, admitindo-se mesmo que em breve desaparecerão. Através da extinção das cópias em formato físico e sem caixas para guardar o disco, o manual nos termos mais saudosos deixa de revestir utilidade.

A profusão dos manuais de instruções, em correlação com a caixa e toda a componente estética (design e arte, para uma síntese cabal na identificação e atracção pelo produto) deu-se com o crescimento e evolução do segmento dos jogos de computador – um processo marcadamente ocidental -, sendo essencial identificar os mecanismos ligados à jogabilidade ao mesmo tempo que se definia o ambiente onde se insere a personagem, com todo o potencial de exploração esmiuçado. Um desenvolvimento destes livros é particularmente visível nos jogos de estratégia, simulação, entre outros, que na sua raiz exigem do jogador uma multiplicação de tarefas.

Instruções em forma de comic já conhecidas na série MGS. Em GTA4, o guia pelas principais atracções na cidade.

Do lado oriental e durante a década de oitenta, apoiada inicialmente pelo desenvolvimento exponencial das máquinas arcade – de simples acesso e com uma adaptação praticamente intuitiva –, mesmo com toda a facilidade posta no acesso, as editoras colavam pequenos posters na lateral do aparelho, mas sobretudo na base de apoio destinada ao stick e botões, dicas e técnicas especiais, combinações de botões e segredos. Um naipe de informações relevantes que simultaneamente exerciam um efeito de persuasão sobre a pessoa que se aproximava dos aparelhos e, à custa de uma leitura imediata do aparelho e dos argumentos que expunha, sentia uma enorme vontade para ligar a máquina.

A marca dos livros de instruções da Nintendo

O fabrico dos jogos para consolas, no tempo anterior ao “crash” e depois com a retoma proporcionada pela Nintendo Entertainment System (NES), generalizou e dotou de uma particular importância o manual de instruções, a fervilhar arte por um número invariável de páginas ao mesmo tempo que constituiu uma base de apoio e de algum conforto na definição imediata do ambiente que seria desfrutado pouco depois. Uma espécie de marcha solitária antes do grande desafio. Qualquer que fosse o género de jogo havia sempre um pequeno livro a acompanhar. Formava-se e ganhava particular a famosa tríade; caixa, manual e jogo, hoje com uma notável importância nos leilões de jogos, sendo incontáveis os utilizadores que pretendem recuperar e reavivar um breve trecho da indústria, chegando ao ponto de rejeitar algumas “gemas” ou raridades só porque o lançador do leilão conduz nas características do produto a falta de um manual, de uma caixa, ou até de ambos.

A advertência está lá. Mapas e dicas só devem ser consultados em última instância.

Para muitos utilizadores, um novo jogo em mãos abria toda uma emoção. Das caixas de plástico às de cartão (por exemplo: da NES, SNES e N64 – a Nintendo só com a GameCube passou a adoptar o formato de caixa de estilo DVD), o simples “processo” de inaugurar um novo desafio ditava em primeiro lugar uma leitura atenta pelo manual, alojado e resguardado dentro da embalagem junto da saqueta que resguardava o cartucho. Muitas vezes esse material suplementar incluía pequenos folhetos de publicidade a outros jogos do mesmo sistema e até alguns autocolantes (uma forma tentadora de marketing). Esse desembrulhar implicava por isso um deslindar guiado, compreensivo e atento antes de arrancar para a actividade.

Porém, nem sempre o esquema de observação e tratamento de um novo jogo se fazia dentro desses moldes. Cuidando que o cartucho era o único elemento realmente importante e imprescindível, o resto não servia veleidades; nenhum tipo de utilização, acabando muitas caixas e respectivos livros de instruções no fundo de um balde de lixo. Não importavam para nada. A vontade para entrar de imediato no espaço virtual era de tal modo um esbulho que não havia tempo para ritual ou primeira compreensão do jogo. Com o trânsito dos anos e perante a indiferença que muitos jogos de épocas encerradas suscitam, esses títulos transferem-se gradualmente de uma poeirenta e degradada caixa guardada num sótão, para a ribalta dos sites de leilões, revisitados por intermédio de fotografias baças e questões colocadas pelos potenciais interessados na arrematação que apontam para o inevitável: “tem manual e caixa?”, perguntam.

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Vítor Alexandre

Redator

Adepto de automóveis é assim por direito o nosso piloto de serviço. Mas o Vítor é outro que não falha um bom old school e é adepto ferrenho das novas produções criativas. Para além de que é corredor de Maratona. Mas não esquece os pastéis de Fão.
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