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Bloodborne - Jornada de terror gótico em Yharnam

A poucos dias do lançamento trazemos mais novidades sobre o enorme desafio preparado pela From Software.

Ao jogar Bloodborne desde a introdução e durante mais de duas horas, Dark Souls II pareceu-me ultrapassado. Não é somente a questão do grafismo exuberante, amparado por uma direcção artística impressionante que batem mais forte nesta nova construção. A fantasia medieval negra bem marcada nos três primeiros jogos da série Souls (se incluirmos o exclusivo Demon's Souls, PS3 2009) levou uma completa transformação, um apagão se preferirmos o termo, e deu lugar a um mundo mais sombrio, traiçoeiro e inquietante, com a monumental cidade gótica de Yharnam, polvilhada de novos inimigos e criaturas monstruosas, a emergirem de uma noite noir como uma peste. Exclusivo de uma consola da nova geração, a PS4 devolveu à From Software as condições ideais para operar um salto geracional nos conceitos e mecânicas que Hidetaka Miyazaki, o director de Demon's e Dark Souls, começou por desenvolver, anos atrás.

Bloodborne é o sucessor espiritual de Dark Souls II, isso é inequívoco: o jogo não rompe com o modelo de jogo que tanta gente conquistou pelo atrevimento e firmeza em combater a linearidade, a fuga para a frente e a mão dada ao jogador à pala de sequências cinematográficas, mas não deixa de marcar uma divisão, sendo precisamente um jogo muito mais próximo das ideias e à imagem do seu criador que assim, com toda esta arte renovada, repleta de influências dos "novel" como o Dracula de Bram Stoker (vale a pena (re)ler por aqui a nossa conversa tida em Dezembro passado, em Londres, por ocasião do vigésimo aniversário da PlayStation, com o próprio Miyazaki e descobrir como o director do jogo se sente muito mais atraído pelo imaginário que guarda dos livros do que pelo cinema) parece estar a jogar as suas fichas neste salto qualitativo da série, sem abdicar de estruturas bem solidificadas como punição e sensação de recompensa pelos objectivos atingidos, assim como uma exploração aberta capaz de levar o jogador a experimentar riscos, enfrentando inimigos para os quais não está preparado.

Hidetaka Miyazaki começou com os combates de mechs em Armored Core, mas foi com Demon e Dark Souls que ganhou projecção mundial. Bloodborne é o jogo no qual mais se revê.

Essas são, desde Demon's Souls, algumas das regras obrigatórias para quem pensa em mergulhar num dos jogos dirigidos por Miyazaki. O sofrimento do jogador e a punição pela perda do seu espólio acumulado às mãos de um inimigo não se oferece de forma gratuita. Há uma intenção em levar o jogador a descobrir o caminho certo, para fugir e vencer os inimigos, uma ordem de procedimentos e um domínio completo dos movimentos e golpes da personagem principal, em lidar, no fundo, com os próprios pesadelos e em concentrar-se na demanda, nem que para isso tenha que memorizar percursos e estratégias.

Em tudo o que podemos descobrir, mexer e equipar, e desde bem cedo somos brindados com imensas coisas, há um significado e uma utilização reservados para dado momento. Cabe-nos conhecer, experimentar, combinar tudo o que nos chega à mão, nem que para isso tenhamos que errar. Uma, duas, três vezes, as que forem precisas até nos sentirmos suficientemente seguros e confiantes na estratégia certa para superar a barreira. A temática e a mecânica da série Souls versam sobre a morte e nisso Bloodborne não é diferente. Morremos para aprender, para jogar com concentração, escutando o ambiente ao nosso redor e perceber os movimentos dos inimigos. Nisso este jogo é incomparavelmente mais apurado, cheio de pequenos detalhes que nos parecem ao princípio vagos ou desligados de interesse mas que operam diferença, como o rebate do sino que leva os inimigos a movimentarem-se num sentido diferente ou então os gritos e gargalhadas desconcertantes de criaturas fantasmagóricas, anunciando um perigo eminente.

Faz toda uma diferença quando iniciamos um jogo desde o começo. Encontramos o ponto de partida e a base que há de sustentar o nosso progresso ao longo de dezenas de horas, o que é muito diferente de uma demonstração de uma parte intermédia do jogo. Ainda sem acesso a opções para "multiplayer" e as tão apregoadas "chalice dungeons" concentramo-nos nas primeiras áreas com destaque para Yharnam e Dream Refuge. Após uma cena introdutória desconcertante, na qual somos brindados com uma criatura aterradora - importa reforçar que este jogo está dotado de uma fortíssima estética -, um humano de rosto coberto de rugas e voz funda leva-nos a aceitar um contrato. A partir daí temos acesso ao editor de personagem, altamente personalizado, com destaque para o nome, idade e género, e para um elemento muito importante para o futuro: a origem. Terá tido a nossa personagem um passado violento? Será um profissional ou terá um destino cruel? As opções são inúmeras e cada uma é acompanhada por diferentes valores num quadro de referências. A importância disto não é pouca e será posta em prática mais à frente.

Por enquanto e após a edição completa do nosso "eu" no jogo, começamos por entrar em Yharnam, num ponto distante ainda do centro e no interior de uma mansão típica de uma Londres vitoriana, o tempo de Bloodborne. A nossa personagem não tem armas, não possui qualquer equipamento de combate ou farda e os seus dois punhos são os únicos instrumentos de ataque e parece-nos leve, mais ágil que as personagens com que começávamos em Souls. À frente um monstro aterrador parece sugar o sangue de um corpo decrépito. Atacá-lo ali e naquelas condições não se afigura como o mais adequado, sendo que fugir também não traz grandes vantagens porque acabamos perseguidos e feitos em tiras de carne e osso nalgum beco. De um modo ou de outro vamos morrer, sendo depois transportados para um outro local onde criaturas fantasmagóricas nos oferecem armas, como a "saw clever", a "hunter axe" e a "threaded cane", uma espécie de chicote com lâminas afiadas. Destaque para a "hunter pistol" uma arma de fogo e uma das grandes inovações em termos de armamento disponível em Bloodborne, com particular eficácia nos ataques a curta distância.

No ecrã de pausa podemos equipar itens de selecção rápida e escolher que tipo de arma queremos usar na mão direita e na mão esquerda. A ausência de um escudo nesta primeira fase é algo que se torna perceptível mas mais à frente terão acesso a esses meios de defesa. Regressando a Yharnam, descobrimos que o "tutorial" se encontra integrado numa espécie de caveiras que borbulham sobre o soalho da mansão onde nos encontramos ao princípio. Movimentos de ataque com as armas são relevantes e depressa aprendemos a tirar proveito de cada uma, mas não é menos importante o conjunto de opções de evasão que permitem ao protagonista saltar para trás ou rolar para os lados. Isto marca a diferença entre sobreviver e prosseguir ou acabar em mais um ecrã de loading que nos atira para trás.

Ambientes sombrios e lúgubres, onde cresce natureza morta.

"Em termos de combate noto que Bloodborne está diferente da série Souls."

Entrando por um dos portões de Yharnam percebemos imediatamente que muitas das saídas encontram-se condicionadas e vedadas, nesta primeira fase. À semelhança de Dark Souls, as áreas de jogo são abertas mas só em momentos posteriores iremos transitar facilmente entre todas. Por enquanto seguimos ao longo de um percurso obrigatório, embora com possibilidade de explorar saídas alternativas. Os inimigos escondem-se em todos os recantos, aproveitando uma penumbra para desferir uma estocada que muito embora podendo não ser letal, nos deixa altamente enfraquecidos. Claro que as "blood vials" regeneram o nosso indicador de saúde e há muitas para recolher, quer em caixas que podemos partir com as nossas armas, quer no "loot" deixado pelos inimigos mortos sob a forma de uma luz brilhante.

Em termos de combate noto que Bloodborne está diferente da série Souls. Não faz uma grande transformação completa mas a interacção com os inimigos é mais imprevisível e mesmo que tenhamos que gerir bem a barra de esforço nunca devemos facilitar e esperar que um inimigo tombe após dois ataques cirúrgicos pois o mesmo pode responder com um ataque letal à pala da sua última golfada de ar. Algo particularmente visível nestes confrontos é o sangue libertado pelos golpes e como este vai salpicando a nossa personagem, cobrindo a sua longa gabardina com manchas, estendendo-se ao chapéu, sapatos e calças. O efeito visual é realmente impressionante.

Mas ainda há arestas por limar. Depois de mortos alguns inimigos são pontapeados pela nossa personagem como se fossem papéis de embrulho de presentes. Pequenos objectos que seriam pontapeáveis, como uma cartola caída no chão, simplesmente barram o movimento à nossa personagem se for ao seu encontro. Uma dificuldade maior é que desta vez os inimigos estão feridos de uma praga endémica que os deixou ainda mais danados, mais atentos à nossa passagem. Os "residentes" de Yharnam circulam em grupo pelas ruas onduladas, onde há coches tombados e sinais de uma desgraça que voltou ao avesso a cidade. Atirar uma pedra a um deles, depois de fazer "lock" é a solução para eliminar um a um, mas este processo gradual que vinha de Dark Souls, de eliminar um amigo e ameaça de cada vez mudou. Será inevitável, num dado momento, quando o bando é alertado para a nossa presença, confrontar todos os inimigos. A solução passa por recorrer a outras soluções, desde cocktails molotov até à arma de fogo. Apesar do curto alcance dos disparos, do reload, escassez de munições e danos inferiores aos danos dos golpes praticado com a "saw cleaver", por exemplo, lá conseguimos reduzir a ameaça e passar à frente.

Desatar numa correria pode ser uma solução temporária mas não oferece grandes veleidades. Após a morte da nossa personagem é imperativo voltar a chegar ao ponto onde perdemos a vida, sob pena de perdermos todo o pecúlio acumulado. Agora os inimigos podem fazer deles o nosso "loot" e só o recuperamos depois de aniquilarmos o inimigo que ficou com o espólio. Alguns transportam candeias e erguem tochas, derramando líquido a arder sobre a nossa personagem, isto enquanto as atacamos, dando origem a bolas de fogo. Alguns usam protecções e conseguem defender-se numa primeira instância.

É importante gravar a posição sempre que possível, acendendo as lanternas em pontos específicos, lanternas que vieram para o lugar dos bonfires. O problema é que não há muitas e entre os pontos de gravação não faltam perigos, criaturas e ameaças de diferente espécie. Sobreviver é difícil. A quantidade e diversidade de inimigos presentes nesta primeira etapa até ao primeiro boss é impressionante. Encontramos enormes corvos rastejantes, bestas com o dobro ou o triplo do tamanho de um humano comum, cães de mandíbulas visíveis e outros caninos do tamanho de bisontes. A sua caracterização e apresentação não é menos que aterradora e o primeiro boss, de corpo gigantesco, mal o encontramos, lança um poderoso e letal ataque. No entanto, esta primeira parte está longe de ser realmente complicada. Com alguma persistência e rigor nos movimentos, esperando pelo momento certo, conseguimos levar de vencida grande parte das criaturas que deambulam por Yharnam. No entanto, haverá momentos em que a fasquia de dificuldade subirá naturalmente e nem é preciso testemunhar a verticalidade das áreas, que tanto nos possibilita explorar os esgotos, para logo darmos conta que ali os inimigos são demasiado poderosos para o nível de experiência da nossa personagem, como podemos seguir a outra alternativa arriscando um combate com um "boss".

Os combates serão diabólicos e terão por base oponentes tão colossais como assustadores, tão equacionáveis por quem vive o pesadelo como imprevisíveis pela sua movimentação.

Nesta antevisão final, a pouco mais de uma semana do lançamento do jogo, jogámos pouco mais do que o prólogo, no fundo a ambientação a Yharnam, mas há muito, muito mais para explorar nesta avassaladora incursão ao pesadelo mais firme que Hidetaka Miyazaki tornou demasiado vivo para assustar os jogadores mais ou menos temerosos, porque os fãs de sempre há muito que aguardam põe chegar a esta magnífica cidade gótica. Resta saber até que ponto a FromSoftware conseguiu lidar com as aspectos técnicos, cadência de frame rate e outros pormenores, que sempre se perfilaram como as maiores dificuldades do estúdio. O que não duvidamos é da extensão enorme em termos de design, sendo também um jogo diferenciador pelo combate e forma como os desafios estão interligados. Bloodborne é uma experiência grandiosa, aterradora e desafiante. Queremos provar mais deste sangue.

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Bloodborne

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Vítor Alexandre

Redator

Adepto de automóveis é assim por direito o nosso piloto de serviço. Mas o Vítor é outro que não falha um bom old school e é adepto ferrenho das novas produções criativas. Para além de que é corredor de Maratona. Mas não esquece os pastéis de Fão.

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