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Assassin's Creed: Syndicate - Análise

A série dá um passo na direcção certa.

Eurogamer.pt - Recomendado crachá
Syndicate é um dos jogos mais divertidos de 2015, até agora. É uma experiência firme. Os pequenos bugs dificilmente arruínam a diversão.

Assassin's Creed em particular e a Ubisoft no geral, tornaram-se na piada da indústria dos videojogos. Aquela tirada cómica que todos conhecem e que rapidamente gera gargalhadas entre os conhecedores deste nosso dia-a-dia. Sinceramente é bem feito. Não critico os lançamentos anuais, afinal se as vendas provam que os fãs querem mais, então que seja feita a vontade do povo. Critico a falta de atenção e cuidado que os jogos começaram a apresentar. Podemos culpar o ritmo frenético mas perante equipas de quase 200 pessoas, tempo não será uma desculpa certamente. Unity de 2014 foi o expoente máximo que catapultou a série para o desaire. A aventura de Arno e Elise sofria de inúmeros problemas de performance, falta de optimização e bugs absurdos mas foi muito mais do que isso. Mais do que os problemas técnicos, seja a nível narrativo como a nível de design, Unity não foi um título lá muito inspirado, o que somando tudo, deu à série um ar de cansaço.

Aliás, como os jogos em mundo aberto estão cada vez mais na moda, começa a existir até uma certa fadiga em relação a eles, no entanto são dos títulos que melhor expressam as possibilidades destas novas plataformas. Mundos enormes a brilhar com vida e com poucas interrupções são, sem dúvida, um grande chamariz para quem vai comprar uma nova consola ou procura um jogo de destaque. Fadiga de jogos em mundo aberto, lançamentos anuais e uma fartura de bugs são três elementos que em nada abonam a favor de Assassin's Creed. Apesar disto, começando com o "carismático mas não tanto" Edward Kenway em Black Flag, passando pelo "quero fixe mas deixo de ser de tanto tentar" Arno em Unity, esta geração tem recebido os seus jogos da série e começa agora a ser fácil identificar alguns dos problemas.

Olhando para aquele que foi o último "grande" Assassin's Creed (para mim foi Revelations pois foi mesmo divertido), sentimos que a escala está a crescer mas o foco dispersou-se. Os jogos estão maiores, as missões mais complicadas, mais antagonistas, o enredo aprofundou mas também complicou, as mecânicas de jogo diversificaram, as tarefas opcionais ampliaram até ao abuso, e fica a sensação que está disperso, demasiado complicado e grande para se tornar divertido. Ora então quais são as principais linhas? Assassin's Creed tornou-se confuso no enredo, existem tarefas secundárias tão repetitivas que são claramente para encher chouriços, as missões de assassinato têm potencial mas sofrem com más escolhas de design, e os coleccionáveis são tão exagerados que parece que o estúdio os meteu ali apenas porque sim.

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Como resolver isto? A ideia será criar uma experiência na mesma de atmosfera e ambiente poderoso, mas com um ritmo de progressão mais adequado. Talvez reduzir o número de tarefas secundárias de forma a não saturarem, contextualizando com a narrativa e ambiente para as poderem repetir. Podem ampliar a personalidade e carisma com uma dupla de protagonistas, podem reduzir o número de coleccionáveis, moldar o ritmo de jogo e a dinâmica da experiência, para que tudo se sinta mais fluído e divertido. Acredito que foi algo por estas linhas que o Ubisoft Quebec pensou quando ficou com a "batata quente" depois do desastre do Unity. Assassin's Creed: Syndicate é um título mais charmoso, mais interessante, mais coeso e mais divertido do que Unity. Isto era o mínimo que se pedia.

Primeiro vamos ao que interessa, é o que vocês querem todos saber: Não, Syndicate não é o desastre dos bugs que foi Unity. Ao longo das mais de 20 horas que precisei para chegar ao final da Nona Sequência, encontrei os esperados bugs num jogo em mundo aberto desta escala. Um ou outro NPC que surge do nada, edifícios cujas texturas mudam de resolução à tua frente, animações estranhas ao descer uma chaminé, e vi apenas uma vez numa cutscene o cabelo entrar pela cara do Jacob. São problemas mínimos tendo em conta a escala do jogo, e a performance é simplesmente perfeita. Senti que Syndicate foi firme do início ao fim sem sentir quaisquer problemas nos controlos ou na fluidez do jogo. Claro que a jornada dos irmãos Frye não sai ilesa, pelo contrário, mas é um passo na direcção correcta.

Afinal quem são estes Frye? Jacob e Evie Frye são dois irmãos gémeos, filhos de dois assassinos dos arredores de Londres. Jacob, inconsequente e destemido, prefere resolver tudo à bruta, não pensa muito no futuro e focando-se no objectivo presente. Está ansioso por ser mais do que um mero cumpridor de tarefas da irmandade nos subúrbios, sedento de vingança pelo seu pai que faleceu enquanto tentava tirar o domínio de Londres a Starrick. Evie vai buscar a sensatez e inteligência à sua mãe, prefere pensar antes de agir, se possível de forma discreta. Estuda cuidadosamente os artefactos anciãos espalhados pelo mundo e apenas concorda em ir para Londres com Jacob porque descobre que está lá um, muito importante diga-se.

Ao chegarem a Londres, Jacob entra a matar e começa por atacar de frente os Blighters, gangue que Starrick usa para exercer influência em Londres. Seja no domínio de locais importantes com assistência dos templários, seja no controlo de fábricas onde trabalham crianças, seja na protecção de criminosos procurados ou na manipulação de políticos, Starrick está em todo o lado e Jacob quer ver os Blighters a cair. Jacob não mede as consequências das suas acções, e cego pelo seu objectivo, segue um caminho diferente do da sua irmã. Evie, prefere focar-se nos objectivos da irmandade e persegue o Sudário, uma peça de extrema importância que pode converter Londres de vez para os templários. Os dois protagonistas permitem sentir Londres de formas distintas.

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A história ramifica-se em duas vertentes completamente diferentes com emoções e diversões quase opostas. Frequentemente criticada pelas suas personagens sem carisma, Assassin's Creed encontra na dupla Frye uma personalidade profunda o suficiente para agradar o público. Mesmo que algumas personagens não sejam tão bem aproveitadas quando mereciam, mesmo que o enredo ocasionalmente se torne um pouco estranho na forma como se traduz nas missões, Syndicate relembra os dias gloriosos da série. Foi um dos elementos mais importantes para me deixar apaixonado pelo jogo. Frequentemente temia que os bugs estragassem o jogo, mas acabei por me concentrar mais na diversão e foi quando percebi que o jogo conquista.

Enquanto a história de Jacob nos leva a conhecer todo o tipo de personalidades, muitas delas parte da história real, Evie já relembra mais a serenidade e elegância de Ezio. Jacob mete-se em aventuras de uma escala que ninguém poderia imaginar, mete-se na luz do dia com os focos apontados a si, enquanto Evie age de acordo com o código da irmandade, sempre preocupada em proteger o sigilo de tal empreendimento. Isto coloca-nos perante missões diferentes, com objectivos secundários para total sincronização, que acabam por influenciar a forma como vemos a personalidade de cada um. A forma como o enredo de Syndicate está construído e é apresentado é cativante, muito graças ao carisma da capital de Inglaterra.

Syndicate melhora tudo relativamente a Unity, e para os que não sentiram o apelo dos mares em Black Flag, torna-se ainda mais gratificante. A ausência de multi-jogador é uma grande alegria, mas pelo outro lado o equilíbrio da experiência teve que ser mais cuidadoso. Sem essa vertente para prolongar a longevidade, o Ubisoft Quebec precisou de qualidades para conseguir valorizar o produto sem artimanhas artificiais. Penso que o terá conseguido não só nas tarefas secundárias como também na forma como apresenta as sequências. Ao contrário do esperado, não somos obrigados a seguir uma ordem numerada, e desde o início que Londres está toda disponível.

Assim que chegam a Londres podem começar a percorrer toda a cidade, a descobrir pontos turísticos, lutar pelo controlo de qualquer bairro ou até perseguir os principais e melhores segredos. Esta sensação de liberdade e controlo da experiência é incrivelmente gratificante, sem dúvida uma das formas para me prender inicialmente. Não existem restrições na dificuldade dos locais ou missões, apenas o aviso que podem não querer entrar naquela missão devido ao nível do desafio, mas se quiserem podem. Tal como a personalidade de cada um dos protagonistas, podem entrar de rompante ou passo a passo. Inicialmente perdi-me de tal forma nas tarefas secundárias, na recolha de itens opcionais, na descoberta de segredos que fui subindo de nível e banalizei as missões iniciais. A principal lição que tirei disto é que nenhum segundo se sente perdido em Syndicate.

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Tudo depende da forma como o jogador quer conhecer Londres. Podem trocar de personagem a qualquer momento, apesar de algumas missões serem específicas, enquanto nas missões de assassinato existem até diferentes abordagens. É aconselhado explorar os locais, e quando seguem a sugestão do jogo, conseguem tornar ainda mais interessante essa missão. Desde conversar com alguém para nos ajudar, libertar alguém para iniciar uma forma mais fácil de progredir, existem diversas maneiras de diversificar essas missões e tudo depende do jogador. Estas missões são as que provavelmente vos marcarão mais, devido a estes elementos e à sua intensidade, mas infelizmente também por outros motivos. É precisamente nestas missões, cuja delicadeza é enorme por causa do maior número de variáveis e potencialidades, que mais fragilidades a inteligência artificial demonstra.

Ocasionalmente deplorável, cómica noutros instantes, a inteligência artificial é o principal problema do jogo e pode banalizar a experiência ou até enraivecer o jogador. Nestas missões mais ainda pois sentimos que tudo precisa funcionar como deve ser para um tom mais cinematográfico, e quando falha, é mau. É certo que num mundo desta escala, num título desta natureza, as condicionantes e parâmetros a controlar são inúmeros, mas os estúdios deviam ter sido mais cuidadosos nestes importantes momentos. Pior ainda quando ao longo de praticamente toda a minha experiência livre de bugs, eles teimavam em surgir precisamente aqui, quando tudo devia funcionar como uma máquina bem oleada.

Algumas destas missões perderam toda a credibilidade, profundidade, envolvimento, imersão ou respeito porque o jogo sofria com um bug e me forçava a banalizar, desrespeitar e até injuriar o jogo. Não fossem os objectivos secundários, teria sido muito, muito pior. Reforço que foram poucos os momentos em que isto aconteceu mas foram importantes e reduzem o impacto do jogo, mas não o suficiente para o arruinar. A força de toda a experiência em si é demasiado superior para o permitir. No entanto, fica o aviso que a inteligência artificial e a forma como algumas missões correm podem causar frustração. Espero que a Ubisoft corrija isto.

De certa forma, todos estes elementos e condicionantes que encontrei já estavam presentes em outros jogos da série, mas a Ubisoft precisa começar a ser mais cuidadosa, mais do que foi aqui. A escala da cidade é incrível e os problemas no controlo absoluto de todos os parâmetros de jogo é difícil, mas o Ubisoft Quebec consegue um saldo positivo quando colocado na balança. O tempo que vão passar em diversão no mundo de Syndicate irá ultrapassar largamente os momentos de frustração. Não esquecer a escala de toda esta produção, algo que não deve ser menosprezado apesar de nos dias de hoje ser dado como garantido. Estes níveis de assassinato a lembrar a série Hitman estão no bom caminho mas ainda é preciso mais.

É complicado justificar €60 nos dias de hoje quando um videojogo pode ser um elemento intrusivo na nossa ginástica orçamental para o mês, mas acredito que Syndicate não deve ser julgado pelos pecados de outros mas sim pelos seus méritos. Especialmente quando consegue uma performance técnica quase exemplar, excepto os ocasionais bugs e uma inteligência artificial que pode irritar. Os horrendos crimes de Londres, baseados em acontecimentos reais, que teremos que resolver (algo que já existia em Unity), as missões secundárias de Karl Marx, Charles Darwin ou Charles Dickens, são outras ramificações para o jogador explorar e servem para aumentar a sensação de que o jogador está num outro mundo.

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O que mais me impressionou foi a forma como o Ubisoft Quebec conseguiu moldar o ritmo e fluidez da experiência em Syndicate. Desde a liberdade de exploração à liberdade para enfrentar missões, a consistência dos familiares controlos de Assassin's Creed, o simples mas eficaz ecossistema dos Rooks, melhoria de personagens, à criação de armas e fatos. Esta parece ser a melhor prestação da fórmula Assassin's Creed dos últimos anos. O contributo dos gráficos em muito ajuda, e quando o jogo corre como deveria, algo que faz na maior parte do tempo, não conseguimos deixar de ficar deslumbrados. Parece que estamos mesmo ali, parece que se esticarmos a mão tocaremos num daqueles tijolos vermelhos tão característicos. Este é o principal poder de Assassin's Creed, transportar o jogador para uma outra era, e Syndicate consegue fazê-lo.

Se graficamente impressiona e demonstra bem as capacidades das actuais tecnologias nos videojogos, Syndicate não se acanha nada em impressionar o jogador com a sua componente sonora. O trabalho dos actores cumpre sem grandes destaques (excepto uma personagem que vão encontrar mais lá para a frente) mas consegue ser competente o suficiente para evitar embaraços ou críticas. Onde nada se pode criticar é no trabalho de Austin Wintory, compositor da envolvente banda sonora que me deixou durante muitos minutos com o comando pousado só para ouvir a música. Quando estão num dos pontos de sincronização, a música toca enquanto lá estiverem, e assim fiquei, a escutar, a ver, a sentir Londres.

Que não fiquem quaisquer dúvidas, Assassin's Creed: Syndicate tornou-se num autêntico vício e continuarei a jogar por umas boas semanas. A ausência de multi-jogador foi recebida com grande entusiasmo. Finalmente temos uma experiência de jogo fluída e coesa, sente-se mesmo que não seria possível de forma alguma na anterior geração. Não nesta escala. Londres é fantástica, a cidade respira vida, envolve-nos na sua atmosfera e posso arriscar dizer que este é o expoente máximo na fórmula Assassin's Creed. À partida estava condenado pelos pecados de Unity, mas a dupla Jacob e Evie entra com garra e triunfa. Mesmo para alguém que estava fatigado de jogos em mundo aberto, os encantos da época e da jogabilidade fizeram com que me apaixonasse por Syndicate. Considero-o um dos melhores jogos da série.

Assassin's Creed Syndicate corrige as principais falhas de Unity e consegue uma personalidade muito atractiva. Dá um importante passo em frente para se distanciar da controversa situação em que a série se colocou. Mesmo que o mundo esteja pronto a condenar à partida para manter a sátira, o trabalho do Ubisoft Quebec deve ser respeitado e mesmo que ainda exista muito para limar, estamos a seguir na direcção indicada e qualquer fã que respeite a série saberá que quando Assassin's Creed funciona como deve ser, poucos jogos se comparam.

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