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Punch-Out! - Quem tira o cinto de campeão a Little Mac?

31 anos depois da arcada da Nintendo, recuperamos uma série especial, até aos revolucionários socos em movimento.

Dodge his punch, then counterpunch, Doc Louis, in Mike Tyson's Punch-Out!.

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Apesar da maior popularidade e abrangência dos "fighting games" sobre o segmento específico dos jogos de boxe, muitas pessoas que estudam a indústria dos videojogos apontam para a cabine arcade da Sega, Heavyweight Champ, como o primeiro "fighting game", precisamente por proporcionar combates com golpes de mão entre dois oponentes. A arcada saiu no Japão em 1976, apresentando uma perspectiva lateral do combate, a preto e branco, e só em 1987 viria a apresentar uma perspectiva tipicamente tridimensional, nas costas do lutador, numa sistema altamente enquadrado no modelo de Punch-Out, o jogo de boxe criado pela Nintendo, para as arcadas, corria 1984.

O modelo dos jogos de boxe é mais tradicional e circunscrito em termos de golpes do que a fantasia e virtualidade que emana dos fighting games depois de Street Fighter, Fatal Fury, King of Fighters, entre outros. A vertente estratégica, assente na oportunidade para surpreender o adversário com alguns golpes, nunca permitiu grandes veleidades aos produtores, senão mergulharem naquele estilo de luta muito próximo e corporal. Em meados dos anos oitenta, a projecção mundial do desporto estava garantida com símbolos como Muhammad Ali, Mike Tyson e Rocky Balboa nos cinemas. O sucesso da modalidade foi muito superior nos Estados Unidos da América, constituindo uma oportunidade para muitos produtores de jogos, tanto ao nível das arcadas como das plataformas domésticas, na recuperação do "crash" causado pela Atari, no começo dos anos oitenta.

Contudo, a entrada da Nintendo nos jogos de boxe não foi preparada para aquele momento ou desenvolvida com antecedência. Reconhecendo a importância do desporto e segmento de mercado, alguns factores laterais ao interesse em proporcionar uma arcada baseada no boxe contribuíram para o desenvolvimento de Punch-Out!

A estreia de Punch-Out!, nas arcadas

A produção de Punch-Out! começou em 1983, quando a Nintendo enfrentava uma concorrência maior nas arcadas, com jogos como Dragon's Lair, da LaserDisk, a superiorizarem-se aos seus jogos electromecânicos, baseados em vídeo. A tentativa de encontrar uma nova tecnologia que pudesse produzir melhores sprites e rotação, levou a empresa a trabalhar no hardware e a desenvolver melhores soluções. Por outro lado, o enorme sucesso de Donkey Kong contribuiu para uma aquisição de monitores ao nível das vendas do jogo. Mas assim que as vendas recuaram, os monitores acumularam-se em pilhas. O que fazer com aquele stock acumulado? A ideia passou pelo fabrico de uma máquina arcada que pudesse dar uso a dois monitores. Nada melhor que um jogo de luta, isto depois de uma tentativa fracassada de um simulador de corridas. Dois oponentes num jogo de boxe: o desporto ideal para a máquina em desenvolvimento.

A arcada não era pêra doce. O jogo foi um sucesso nos Estados Unidos, levando a Nintendo a responder com uma sequela.

Entre os elementos da equipa de desenvolvimento de Punch-Out! rapidamente se destacaram Genyo Takeda e Shigeru Miyamoto, nessa ocasião ainda muito envolvido nos jogos arcada e na secção de planeamento, da Nintendo. Takeda contribuiu especialmente com a visão de jogo e em vocacionar a produção especialmente para o mercado americano, tomando como partida um modelo de jogabilidade imediata, complexa e desafiante. O produtor colocou até algum optimismo numa toada realista quando pensou em desenvolver luvas para que o jogador pudesse agir directamente, numa espécie de controlo por movimentos. Mas Miyamoto, que a partir de 2000 apoiou os comandos por movimentos, não ficou agradado com a sugestão e insistiu na colocação do tradicional joystick e botões, disponíveis na versão final.

Os desenhos, arte e concepção das personagens são da autoria de Miyamoto. O visionário autor quis vincar muito bem os traços e personalidades dos oponentes, diferenciando simultaneamente as suas características, golpes, pontos altos e baixos. Em 1993 nasceram Glass Joe, Bald Bull, entre outros. A qualidade artística do jogo impressionou quem o pôde experimentar nas arcadas, mesmo que a personagem do jogador fosse apresentada com transparência e os contornos por fios. A Nintendo contou ainda com o préstimo da companhia japonesa de animação, a Studio Juno, responsável pelos frames de animação de cada boxeur. Para aprimorar o jogo e dar um toque pessoal, este estúdio desenhou, entre o público, as personagens Mario e Donkey Kong, como espectadores do combate.

Uma máquina de colecção. Nos EUA há quem só coleccione arcadas da Nintendo.

A mecânica do jogo primou pela acessibilidade, sem esquecer o desafio sempre que o jogador derrotava um oponente e enfrentava um adversário mais complicado, impressionando pelo seu corpo medonho. A estratégia passava por observar os movimentos do adversário, fugindo para a esquerda ou direita, assim que o mesmo desse sinais de execução do golpe, para logo de seguida aplicar um soco em jeito de contra-ataque. As partidas duravam 3 minutos e conectar com sucesso uma série de golpes deixava o adversário à beira do KO. O pior era Mr. Sandman, o último de seis lutadores.

O sucesso do jogo conduziu a Nintendo a nova investida e a retocar a jogabilidade, incluindo o tão pedido agachamento. Um êxito no mercado norte-americanco, Super Punch-Out! beneficiou da mesma aceitação e valorização do original. A Nintendo optou desta vez por introduzir cinco das seis personagens, só que melhorou completamente os seus golpes e técnicas. Dragon Chan, até se lançava às cordas de modo a aplicar uma patada no boxeur controlado pelo jogador. Super Punch-Out foi o último jogo da série lançado pela Nintendo nas arcadas. Com o sucesso da Famicom e da NES, o salto para as consolas domésticas era o passo lógico.

A transição dos combates para as plataformas domésticas.

O desenvolvimento do jogo para a NES ofereceu novos desafios aos produtores. Não obstante a boa qualidade de muitas produções em meados dos anos oitenta, quando a Famicom era um sucesso exponencial no Japão, a verdade é que nas arcadas a margem de produção ainda era significativa. Daí que para Makoto Wada, o responsável pela direcção de Punch-Out! para a NES, a principal preocupação tenha sido a manutenção do tamanho abissal dos oponentes, em contraponto com o aumento da área de jogo. Este efeito causou uma diminuição incrível da personagem controlada pelo jogador, relegada para um papel do género David contra Golias, o que imediatamente suscitou o baptismo de Little Mac, um "nick name" que não podia ser mais apropriado.

A Nintendo apostou imenso na imagem de Mike Tyson para promover o seu jogo. Mas em 1990 e com a perda do título de campeão, o acordo não foi renovado.

O aspecto visual do jogo foi a maior transformação, embora tenham sido mudados parâmetros como a estrutura de 3 rounds e a eliminação da barra KO. Os "uppercuts" serviam de contra-ataque aos golpes do adversário e o estado de resistência de Little Mac, visível num indicador de corações, significava que golpes insistentemente falhados e socos recebidos sem defesa o deixavam à beira do KO. Entraram novas personagens, os míticos Von Kaiser e Don Flamenco. Foi introduzido o treinador Doc Louis, responsável por dicas sobre como vencer determinado oponente e as famosas barras de chocolate. Esta personagem não controlável tornou-se rapidamente num ícone da série, dando um decisivo contributo para a personalidade de Little Mac.

Mas a parte emblemática deste jogo acontece com a inclusão do peso-pesado Mike Tyson, campeão invicto e um muro indestrutível em 1987. Minoru Arakawa, chefe da Nintendo para os Estados Unidos, expressou o seu desejo em contar com o campeão no cartucho, como último grande oponente, destacando-se pelo seu aspecto colossal. O campeão de boxe deu a sua cara à capa do jogo, numa versão muito bem sucedida no mercado norte-americano, superando um milhão de unidades vendidas, um número fantástico para a época.

Só que a perda desse estatuto às mãos de James "Buster" Douglas, em Fevereiro de 1990, levou a Nintendo a repensar a manutenção de contrato com o pugilista, pouco disposta a continuar a promover o seu jogo com um boxeur que já não era visto como o melhor. Sem renovar o contrato, a Nintendo editou novo Punch-Out! para a NES, em 1990, e com um novo oponente final: Mr. Dream, uma espécie de Mike Tyson, adulterado.

Super Punch-Out! e o regresso ao modelo do original

Seguiram-se quatro anos de interregno, até que a equipa de Makoto Wada regressou em 1994 com uma nova versão, agora baseada no legado da arcada, precisamente a expensas da capacidade superior da Super Famicom (ou Super Nintendo como é conhecida no ocidente), capaz de proporcionar um maior tratamento dos lutadores, sprites e agora em larga escala. Com efeito, Little Mac cresceu, ganhou até uma imagem diferente, e o jogo primou pelos belos sprites e maior colorido, pontos em quase tudo superiores aos do original para a arcada, nessa altura com dez anos.

Super Punch-Out! na Super Nintendo recuperou o conceito original da arcada e com muitas melhorias.

O regresso à forma do original implicou um rompimento com as novidades da versão para a NES. Desapareceu o indicador de corações e regressou a barra de KO. Das 16 personagens criadas para o jogo, apenas 5 regressavam da versão arcade, retocadas e com um aspecto mais agradável. Super Punch-Out conquistou os fãs, embora em menor número que a versão NES, detendo qualidades que o colocam numa lista de jogos obrigatórios para a colecção de jogos da Super Nintendo. Findo o lançamento e o seu contexto de adesão à volta da consola 16-bit da Nintendo, a série voltou ao estaleiro, permanecendo 15 anos fora das órbitas de produção, só regressando em 2009, pela mão dos canadianos da Next Level Games, para gáudio de Mike Inglehart, o director do jogo.

Punch-Out! e os controlos por movimento que Genyo Takeda havia sugerido a Miyamoto

Na consola que revolucionou o sistema de comandos devido à introdução de controlos por movimentos, a Nintendo Wii constituiu a plataforma perfeita para a recuperação da série, há muito ausente. Entregue a missão de desenvolvimento de um novo jogo da série à Next Level Games (que recentemente nos trouxe Luigi's Mansion 2), os produtores não deixaram de sentir-se como privilegiados, ao terem em mãos uma icónica série, oriunda das arcadas e das consolas domésticas, com registos de sucesso.

Não sendo um "system seller", longe disso, é uma série muito valorizada pelos verdadeiros conhecedores e por um agregado de jogadores que vêm de longe, sabendo das peculiaridades que daqui emanam. Depois de uma fase de investigação, a Next Level optou por retomar o modelo de jogo criado para a NES. É que o Wii remote tanto podia ser utilizado acompanhado do Nunchuck, numa disposição para controlo por movimentos, como aparelho autónomo e em posição horizontal, à semelhança do comando da NES.

Versão Wii combinou o melhor da série com os comandos por movimentos. Little Mac ganhou uma nova imagem, a mesma que ficaria para Super Smash Bros. e para a Amiibo.

Os corações e estrelas regressaram, sendo que a maior novidade foi a introdução do sistema de comando por movimentos, algo muito bem implementado e que torna a experiência ainda mais imersiva e realista. Os produtores adicionaram ainda um modo multijogador, com combates para dois jogadores. A Next Level revelou-se cautelosa em matéria de alterações à mecânica do jogo, apontando baterias ao desenvolvimento das personagens, seu balanço e detalhes de combate, e aspecto 3D cel-shaded, tirando partido do progresso em termos de tecnologia disponível quando comparada com uma máquina como a Super Nintendo.

Pena a não inclusão, entre o público, de Donkey Kong, pelo simbolismo que representava, mas é impressionante, dentro do jogo, ir descobrindo as debilidades e os pontos fracos dos oponentes, com as sempre imprescindíveis dicas de Doc Louis quando um assalto corre menos bem. O trabalho de voz e o humor de cada personagem é um ponto alto, a juntar à autenticidade da experiência. Punch-Out! para a Wii é daqueles jogos que segue uma orientação muito arcade, simultaneamente familiar e sempre desafiante, com muitos lutadores muito imprevisíveis e duros de vencer, aparecendo Disco Kid como novidade, um musculado boxeur e amante de diversões nocturnas.

Até ao regresso, o treino continua.

As recentes aparições de Little Mac nos combates frenéticos de Super Smash Bros, nas versões 3DS e Wii U, bem como em forma de Amiibo, revelam bem como este lutador continua nas boas graças dos fãs, eles que bem reconhecem o seu valor como elemento icónico de uma franquia, isto enquanto a Nintendo não decide pelo seu regresso aos ringues. A disponibilidade do jogo lançado para a Wii na eShop da Wii U constitui por isso uma boa oportunidade para reviver não apenas uma série clássica mas um jogo que exemplifica muito bem o sistema de comando por movimentos aplicado com sucesso. Sai um "uppercut", Little Mac.

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Vítor Alexandre

Redator

Adepto de automóveis é assim por direito o nosso piloto de serviço. Mas o Vítor é outro que não falha um bom old school e é adepto ferrenho das novas produções criativas. Para além de que é corredor de Maratona. Mas não esquece os pastéis de Fão.

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